A ética do jornalismo em crise refletida nas HQs.
A crise de valores da sociedade moderna vem afetando todos os aspectos do comportamento humano. Assim como os profissionais da imprensa, que têm que conviver com um cenário onde a ética do jornalismo é assunto assustadoramente frequente, os heróis das HQs também vêm seus princípios éticos e morais deturpados por essa mesma crise cultural.
Desde que foram criadas, as Histórias em Quadrinhos (HQs) sempre tiveram uma forte relação com o público jovem. Mais do que servir como simples entretenimento, destacam-se como reflexo das ideias e das aspirações do público jovem.
O mocinho e o bandido, o herói e o vilão, o bem e o mal, enfim, o certo e o errado, serve na maioria das vezes, como temática de seus enredos, sobretudo nas mirabolantes aventuras dos super-heróis, que atualmente invadiu também a tela dos cinemas. Mas o que acontece quando não é mais possível definir de que lado está o personagem?
É espantoso constatar que o primeiro e mais famoso super-herói das HQs, o Superman (personagem fictício da DC Comics), vem perdendo espaço, a cada dia que passa, para uma nova safra de personagens de conduta, no mínimo, duvidosa (ao menos do que se espera de um herói na definição clássica da palavra). Tempos atrás admirava-se o herói, não apenas por seus feitos inumanos, mas também pelo seu caráter e por seus ideais que, na maioria das vezes, estavam relacionados à justiça e à defesa dos ditos ‘fracos e oprimidos’. Atualmente o que se vê, tanto nas revistas quanto nas telas, é uma profusão de violência gratuita, comportamentos duvidosos, acompanhadas de um linguajar por vezes chulo. Os personagens são motivados, quase sempre, por algum tipo de revolta ou vingança e nem sempre estão preocupados em fazer com que se cumpra a justiça. A ideia de que os fins justificam os meios é utilizada a exaustão para justificar ações irresponsáveis. Podemos citar como destaques dessa nova safra personagens com: o Justiceiro, Wolverine, o Lobo e Deadpool. Infelizmente até personagens da velha guarda também embarcam nessa tal crise de identidade, como o Batman, herói criado nos primórdios das HQs, contemporâneo do kriptoniano.
O Superman, hoje considerado pelo público consumidor de HQs como um personagem ultrapassado, em suas narrativas ainda há a noção de que é necessário manter-se íntegro e fiel perante a sociedade. Sua postura inabalável diante da honra, justiça e verdade, soa para o público jovem atual como algo demodé, como se, agir corretamente fosse algo antiquado. Acusado por seus próprios companheiros de ser o ‘senhor certinho’ ou ‘escoteiro de azul’ – citação do próprio Batman -, muitas vezes acaba sendo vítima de seu estilo correto de ser, por atuar numa sociedade que pouco valoriza a honestidade.
Aproveitando o gancho, que relaciona o personagem à profissão, pois o alterego do ‘Homem de Aço’, Clark Kent, é também, um jornalista, percebemos que a situação não é muito diferente na vida real. Assim como o Superman é criticado por se manter fiel aos seus princípios heroicos, nos deparamos com uma realidade em que pensar em ética do jornalismo é quase uma utopia. Em nome da obsessão pela velocidade da informação, a competitividade pelo furo de reportagem, a parca formação dos profissionais, entre outros fatores, acaba por justificar um jornalismo cada vez mais desvinculado da objetividade.
Em suas aventuras o Superman vive em constante conflito com Lex Luthor, legítimo representante do poder econômico e político. Paralelamente, a informação de qualidade também perde terreno para os anúncios publicitários que, tal qual Luthor estão atrelados ao poder do capital.
Diante desse quadro, nos resta assumir uma entre duas posturas: atropelar a objetividade e fazer coro com um jornalismo cada vez mais degenerado ou assumir a mesma postura ‘antiquada’ do Superman que, não se importando com a imagem negativa que fazem a seu respeito, mantém-se fiel ao que julga correto, honrado e ético, comprometido com a verdade e a justiça. Afinal, não são estes valores relacionados ao jornalismo ideal?
Fique atendo ao Meu catálogo de Livros, onde periodicamente abordaremos esse e muitos outros temas relacionados a ética do jornalismo.